Eu entrava cedo no trabalho e chegava em casa por volta das 15 horas. Quando meu pai me disse que havia um rapaz na sala querendo falar sobre livros, fui ver do que se tratava. Não entendemos como ele entrou no prédio de três andares em que cada morador tinha a chave da porta de entrada, que permanecia sempre fechada. Naquele dia e momento estava aberta. O jovem magro, de baixa estatura , roupas escuras e antiquadas sentado na poltrona disse estar captando sócios para o Círculo do Livro, do qual eu havia saído por insatisfação. Ouviu minhas avaliações negativas e não insistiu na tentativa de me convencer. Manteve a calma, falou em tom pausado. Conversamos sobre amenidades, tomou café , disse que ainda iria para o colégio, pois cursava o último ano do Ensino Médio e trabalhava para ajudar nas despesas de sua casa. Eu já havia terminado meu curso universitário e era seis anos mais velha que ele. Me despertou o sentimento de piedade. Parecia infeliz. Considero este um dos piores sent...
Há pessoas que deixam marcas profundas em nós, mesmo que tenham passado de forma efêmera em nosso caminho. Há pessoas árvores e pessoas vento. Pessoas árvores são aquelas que fincam raízes em seu solo sagrado, crescem, dão frutos e/ou flores, sombras acolhedoras e servem de lares para os pássaros. A tarefa divina que recebem é a de serem continentes, provedoras, protetoras. Fortes, não se deixam derrubar por quaiquer tempestades. Aguentam firmes as intempéries, seguem o ciclo das estações e adaptem-se às mudanças do ambiente sem murmúrios, até o momento em que a Natureza determina que seus ciclos de vida devem encerrar-se. E há pessoas vento. Aquelas que são voláteis, que movimentam-se por todos os lados, que percorrem o mundo sem a preocupação de se fixarem e seguirem regras. São donas de si mesmas, passam, desencadeiam mudanças e partem para novas descobertas. Às vezes são ventanias de tempestades, às vezes são brisas calmas e refrescantes no entardecer de um dia quente. Quando ...
Após a partida de quem ocupou um grande e especial espaço em nossas vidas fica um vazio com a forma de quem nele esteve. Passamos a conviver com uma ausência, perturbadoramente, presente. Nossa mente se pega, por vezes, conversando com alguém já ido como se ele fosse nos responder e interagir conosco. Passou a ser como aquele amigo invisível da infância. Com o tempo forma-se uma cicatriz dentro de nosso coração com o contorno de uma figura e no seu interior o que chamo de zona cinzenta, porque para mim cinza é a ausência de vida e de alegria. Cinza é monotônia! É interessante relacionar-se com ausências e seus fantasmas sem nostalgia, mas, um vazio pleno de sentimentos que o tempo vai anestesiando e colocando no modo de adormecimento. Ausências também são seres autônomos dentro de nós, com os quais aprendemos a conviver, pacificamente, ao longo da jornada. Analisando minha trajetória , observo que minha coleção de ausências está aumentando e daqui a pouco s...
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